Cirurgião foi encontrado morto em casa dias após o procedimento, segundo a Prefeitura, que ainda não possui laudo com a causa da morte. Pai conta que ao pedir para trocar curativo viu uma gaze enrolada simulando o pênis: ‘Quando levantou a gaze não tinha pênis visível’. Pai só descobriu situação ao transferir o filho para Teófilo Otoni
MALACACHETA – O cirurgião responsável pela cirurgia de fimose, que é a retirada do excesso de pele no pênis, morreu em casa dias após o procedimento, que ocorreu no Hospital Municipal Dr. Carlos Marx. A confirmação da morte do médico foi dada pela Prefeitura de Malacacheta, que disse não ter sido emitido ainda o laudo com a causa da morte do cirurgião.
A secretaria de Saúde informou que, além do cirurgião, ainda participaram do procedimento um anestesista, um enfermeiro, um instrumentador e dois circulantes de sala. A secretaria disse ainda que solicitou a abertura de um procedimento administrativo.
O pai explicou que após pedir a enfermeira para trocar o curativo sujo de sangue, não conseguir visualizar o membro.
“Eu deixei o meu filho no hospital e minha mãe ficou de acompanhante. Eu fui para uma reunião de trabalho e quando retornei soube que tinha algo errado. A cirurgia que deveria ter durado uns trinta minutos levou cerca de quatro horas. Quando tirou o primeiro esparadrapo, tinha tipo uma gaze enrolada simulando que o pênis estaria ali no meio. Tudo ensanguentado. Quando levantou a gaze não tinha pênis visível. Fiquei doido, falei que isso não era normal”.
O pai conta que chamou o médico de plantão, porque o médico que tinha operado havia ido embora, e ele falou que não podia avaliar porque não tinha participado da cirurgia.
“Eu pressionei: ‘doutor, posso ficar tranquilo que tá tudo normal, então?’. E ele disse ‘não, eu não falei isso, só digo que não tenho condições de avaliar porque não participei da cirurgia’”, conta.
O pai foi ainda atrás do prefeito e do secretário de saúde do município.
“Eu mostrei a foto do meu filho e perguntei ‘isso é normal?’. Eu vi que ele [secretário de saúde] ficou espantado, mas continuou dizendo que estava tudo bem. Horas depois apareceu o médico que fez a cirurgia e disse que estava normal, disse ‘daqui dez dias vai começar a desinchar e vai dar pra ver o pênis dele’”.
Como a criança continuava a reclamar de dores, no dia seguinte o pai assinou um termo de responsabilidade e transferiu a criança por conta própria para o hospital de Teófilo Otoni.
Na unidade, o menino passou por dois novos procedimentos cirúrgicos para avaliar o estado em que se encontrava e, em seguida, para a reconstrução do coto. O pai conta que o laudo do segundo hospital apontou que houve laceração do prepúcio do menino e diz que somente no futuro poderá saber se o filho poderá recorrer a uma prótese.
A conta da internação no hospital em Teófilo Otoni ficou em quase R$ 10 mil e o pai diz que precisou pegar dinheiro emprestado para pagar, pois não recebeu apoio ou assistência do município no primeiro momento. Disse ainda que somente semanas depois, após o caso ter sido repercutido na mídia, a Prefeitura o ressarciu dos custos da segunda internação, mas que não tem prestado assistência à criança.
A Secretaria de Saúde disse que tem prestado apoio através das visitas domiciliares realizadas pela Equipe de Saúde da Família e ofertando consultas médicas e atendimento psicológico. Informou ainda que o pai da criança foi ressarcido dos custos hospitalares no dia 4 de outubro e que tem contribuído com a Superintendência Regional de Saúde de Teófilo, através do Núcleo de Segurança do Paciente, para a investigação do ocorrido.
Investigação
A avó da criança procurou o promotor Roberto Vieira dos Santos, e o Ministério Público solicitou que a Polícia Civil investigasse o caso. O inquérito foi aberto uma semana após a cirurgia que amputou parte do pênis do garoto. O MP aguarda a conclusão das investigações para avaliar quais providências serão tomadas.
A delegada Mariana Grassi Colin informou que está sendo apurado o crime de lesão corporal. Segundo ela, os familiares já foram ouvidos e agora está ouvindo membros da equipe que participaram da cirurgia. A intenção é apurar se o erro foi apenas do médico que o operou ou mais pessoas teriam contribuído para os danos sofridos pela criança.
Reparação
O menino ainda se recupera da cirurgia de reconstrução do coto. Segundo o pai, a criança continua sendo acompanhada pelo médico que fez a segunda cirurgia.
“Agora é acompanhar a recuperação dele. É preciso ver como ele vai reagir, cuidar que ele receba os estímulos necessários para se desenvolver, para que sejam minimizados os danos”.
O pai ainda precisa lidar com muitas perguntas que permanecem sem respostas a respeito da amputação indevida e as consequências dela, mas disse ter certeza de que será longa a batalha que o filho enfrentará para lidar com os danos do erro ao qual foi submetido.
Para arcar com custos do tratamento de saúde da criança, o pai criou uma vaquinha virtual pedindo contribuições a quem possa ajudar. Até o momento a campanha já arrecadou R$ 10.300 na internet.
“Deus tem colocado as pessoas certas no caminho e isso que tem nos dado força para encarar o que for preciso. Tenho milhares de perguntas. O que mais me deixa indignado é que os médicos que atenderam ele em Teófilo Otoni disseram que se o meu filho tivesse recebido atendimento correto desde o primeiro momento, podiam ter minimizado os danos. Se não tivessem omitido que algo havia dado errado na cirurgia, meu filho poderia ter sofrido menos. Agora quero saber o que aconteceu, quero justiça e quero que isso não aconteça com nenhuma outra criança”, conclui o pai. (Fonte: G1 dos Vales)